11.1225 - ONR - BANNER SOBRE A PROIBIÇÃO DA TOKENIZAÇÃO NO ES

Corregedoria do TJ/ES veda vinculação de imóveis a tokens e afirma que uso de blockchain não pode criar sistema registral paralelo

Decisão determina que Cartórios do Espírito Santo não pratiquem atos que associem matrículas imobiliárias a tokens ou representações em blockchain e reforça que a titularidade de imóveis só pode circular no sistema registral oficial, sob supervisão do Poder Judiciário.

A Corregedoria-Geral da Justiça do Espírito Santo decidiu vedar, de forma expressa, qualquer anotação, averbação ou registro que vincule matrículas imobiliárias a “tokens”, representações em blockchain ou outros instrumentos extrarregistrários que pretendam, direta ou indiretamente, representar direitos reais sobre imóveis. A decisão  determina a expedição de Ofício Circular a todas as serventias extrajudiciais do Estado para dar cumprimento imediato à orientação.

No despacho, a Corregedoria reconhece que a chamada “tokenização” de ativos — apresentada no mercado como a conversão de direitos e bens jurídicos em unidades digitais negociáveis em blockchain — vem sendo divulgada como inovação tecnológica, especialmente no setor imobiliário. No entanto, alerta que, na ausência de legislação específica e de integração ao sistema público oficial, esse modelo tem potencial para gerar insegurança jurídica, facilitar práticas como evasão de divisas, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro, além de induzir o público a erro ao sugerir a existência de uma forma alternativa de propriedade imobiliária.

Segundo a decisão, iniciativas que buscam associar imóveis a tokens digitais acabam por criar, na prática, um sistema registral paralelo ao modelo estabelecido pelo Estado. Ao permitir que direitos imobiliários circulem fora do Registro de Imóveis e do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), essas estruturas afastam-se dos mecanismos de controle, publicidade, qualificação jurídica e fiscalização que caracterizam o regime registral brasileiro e garantem segurança jurídica às transações imobiliárias.

A Corregedoria do TJ/ES deixa claro que o problema não está na tecnologia em si, mas no seu uso desconectado da legalidade. O despacho reconhece a importância da transformação digital e da modernização dos serviços notariais e registrais, mas afirma que qualquer inovação deve respeitar os limites institucionais fixados em Lei. A titularidade imobiliária, segundo o entendimento reiterado, é dado jurídico de natureza pública, cuja constituição, modificação e extinção dependem exclusivamente de ingresso no Registro de Imóveis, sob fiscalização do Poder Judiciário.

Para fundamentar essa posição, a decisão do Espírito Santo cita precedentes recentes de outros órgãos do sistema de justiça. Entre eles, o Provimento nº 43/2023 da Corregedoria-Geral da Justiça de Santa Catarina, que passou a vedar expressamente a tokenização vinculada ao registro imobiliário naquele Estado, e a decisão da Justiça Federal da 21ª Vara Cível do Distrito Federal que suspendeu os efeitos da Resolução nº 1.551/2025 do Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI), após ação ajuizada pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR). Em ambos os casos, prevaleceu o entendimento de que a tokenização, nos moldes propostos pelo mercado, configura tentativa de criação de um sistema paralelo de controle da titularidade imobiliária.

O despacho da Corregedoria do TJ/ES também ressalta que o tema envolve matéria sujeita à reserva legal. Isso significa que qualquer eventual modelo de integração entre blockchain e registro imobiliário não pode surgir de iniciativas privadas ou de atos normativos infralegais, mas apenas de um processo legislativo e regulatório que respeite a estrutura do sistema registral nacional e a competência de órgãos como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Do ponto de vista prático, a decisão determina que os registradores de imóveis do Espírito Santo estão proibidos de praticar qualquer ato — seja registro, averbação ou anotação — que vincule a matrícula a tokens digitais, plataformas privadas de blockchain ou instrumentos semelhantes, ainda que sob a alegação de caráter meramente informativo. A vedação alcança inclusive tentativas de associar tokens à titularidade do domínio, a frações ideais, a direitos de preferência ou a qualquer forma de participação patrimonial imobiliária.

Além disso, a Corregedoria determinou o envio do expediente à Comissão Revisora do Código de Normas do Estado, para análise da incorporação formal dessas diretrizes ao texto normativo estadual. A medida indica que o entendimento adotado no despacho não se limita a uma orientação pontual, mas tende a consolidar-se como regra permanente no âmbito do ordenamento extrajudicial capixaba.

A decisão do TJ/ES se insere num movimento mais amplo de afirmação institucional do sistema registral brasileiro diante de pressões de mercado por modelos alternativos de circulação de direitos imobiliários. Ao alinhar-se às decisões da Justiça Federal, de outras Corregedorias Estaduais e às diretrizes defendidas pelo ONR, a Corregedoria reforça a compreensão de que a propriedade imobiliária não pode ser fragmentada, negociada ou publicizada em ambientes privados à margem do Registro de Imóveis.

Para o ONR, a decisão contribui para dar previsibilidade jurídica a um cenário em que plataformas digitais e estruturas financeiras passaram a anunciar “investimentos imobiliários tokenizados” como se fossem equivalentes à propriedade formal. A decisão reafirma que a evolução tecnológica no setor é possível e desejável, mas deve ocorrer dentro do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis e do SERP, com regras técnicas claras, supervisão pública e plena rastreabilidade.

Confira a decisão da Corregedoria-Geral da Justiça do Espírito Santo na íntegra:

Por Luana Lopes 

Assessoria de Comunicação do ONR 

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