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ONR apresenta avanços da Fase 4 do SREI e define base da situação jurídica eletrônica das matrículas

Workshop em São Paulo reúne Diretoria Executiva, Conselho Deliberativo, Comitê de Normas Técnicas e equipe técnica para detalhar a modelagem em JSON, o Cadastro Nacional de Matrículas e o uso de Inteligência Artificial na consolidação dos dados do Registro de Imóveis brasileiro

Na última terça-feira (09.12), o Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR), responsável pela coordenação da infraestrutura digital do Registro de Imóveis brasileiro, realizou um Workshop interno em São Paulo para apresentar o estágio atual da Fase 4 do projeto que estrutura o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI) em todo o país. 

Ao longo do encontro, integrantes da Diretoria Executiva, do Conselho Deliberativo, do Comitê de Normas Técnicas e a equipe técnica detalharam os avanços na modelagem de dados da escrituração eletrônica, na consolidação da situação jurídica em formato digital, na definição do produto mínimo viável (MVP) do núcleo do sistema e no cronograma de testes previstos para 2026, com foco em padronização nacional e interoperabilidade entre Registros de Imóveis e instituições.

O ponto de partida foi a apresentação da arquitetura atual do SREI, concebida para atuarcomo uma camada nacional de interoperabilidade entre os sistemas já utilizados pelos Cartórios. Em vez de um programa único centralizado fazendo toda a escrituração dentro do próprio ONR, a estratégia adotada é construir modelos de arquivos eletrônicos padronizados que os sistemas dos Cartórios deverão gerar ao final de cada procedimento registral. Esses arquivos descrevem, em linguagem de dados, os atos de registro e averbação dos Livros 2 e 3, os lançamentos de protocolo do Livro 1 e, principalmente, a situação jurídica atualizada da matrícula, permitindo que a informação jurídica do imóvel seja consolidada de maneira uniforme em todo o território nacional.

A equipe técnica explicou que a Fase 4 do projeto está organizada em três grandes frentes. A primeira é a modelagem detalhada da escrituração eletrônica, que deixa de trabalhar apenas com campos gerais para contemplar mais de trezentos tipos de atos de registro e averbação, cada um com suas regras de negócio, hipóteses de aplicação e campos obrigatórios, estruturados em temas e acompanhados de um dicionário de dados que define com precisão o significado de cada atributo. 

A segunda frente é a especificação do chamado Título Estruturado, um modelo padronizado de arquivo eletrônico que representa contratos e instrumentos recebidos de instituições financeiras e tabelionatos de notas, como contratos de compra e venda, cédulas de crédito, termos de quitação e outros documentos que dão origem a registros. A terceira frente é a definição do MVP do núcleo do sistema, isto é, a primeira versão funcional com o conjunto essencial de módulos que permitirá iniciar os testes em ambiente real, colher aprendizados e evoluir a solução de forma incremental.

Nesse desenho, o ONR decidiu substituir a antiga especificação em XML, uma linguagem de marcação historicamente usada para estruturar dados, por modelos em JSON, um formato mais simples e amplamente adotado nas aplicações contemporâneas de tecnologia. A mudança responde tanto às críticas de complexidade feitas por empresas de informática que atendem os Cartórios como à necessidade de tornar a implementação mais acessível sem abrir mão da consistência. Embora o JSON tenha menos recursos nativos de validação que o XML, a combinação de regras de negócio, dicionário de dados e testes automatizados busca assegurar a robustez exigida pelo sistema nacional de Registro de Imóveis, preservando a segurança jurídica como parâmetro central.

Um dos temas enfatizados no workshop foi o Cadastro Nacional de Matrículas (CNM), apresentado como eixo estruturante da interoperabilidade do SREI. O CNM atribui a cada matrícula do país um identificador único, permitindo que instituições financeiras, órgãos públicos e plataformas privadas localizem o imóvel diretamente por esse código, sem depender de buscas manuais por município, circunscrição ou número interno do Cartório. Para o usuário final, continua a existir a referência à matrícula local tal como é utilizada hoje, mas, nos bastidores, a relação com o CNM passa a organizar o ecossistema eletrônico, facilitando integrações e reduzindo ambiguidades na identificação de imóveis.

Outro eixo relevante foi o detalhamento do Título Estruturado, pensado inicialmente para a interação com bancos e tabelionatos de notas. A proposta é que contratos, cédulas e demais instrumentos cheguem ao Registro de Imóveis em um formato eletrônico alinhado à mesma modelagem de dados que sustenta a escrituração e a situação jurídica, reduzindo retrabalho na digitação, diminuindo o risco de inconsistências e permitindo um fluxo mais direto entre o que foi contratado e o que será registrado. No campo da interlocução com outros órgãos, a equipe também relatou o avanço das tratativas com a Receita Federal do Brasil (RFB) para reorganizar a forma de envio da Declaração sobre Operações Imobiliárias (DOI), com a perspectiva de que esses dados sejam encaminhados em lotes ao ONR e, a partir dele, distribuídos às diversas destinações legais, racionalizando o fluxo de informações fiscais de origem imobiliária.

No núcleo do MVP, três módulos foram apresentados com maior detalhamento. O módulo de Cadastro funcionará como a porta de entrada e o painel de controle das solicitações, centralizando pedidos, protocolos e interações. O módulo de Consolidação da Situação Jurídica será responsável por ler o histórico da matrícula, aplicar as regras de negócio, interpretar os atos praticados e gerar um arquivo JSON estruturado que traduz a situação jurídica vigente do imóvel em linguagem de dados. Já o módulo de Certidão da Situação Jurídica transformará esse arquivo estruturado em um documento oficial, emitido pelo Registro de Imóveis, com assinatura digital e disponibilização para consulta e download em meio eletrônico. A previsão apresentada é iniciar os testes com Cartórios-piloto ligados à Diretoria Executiva e ao Comitê de Normas Técnicas a partir de janeiro de 2026, consolidar ajustes em fevereiro, liberar a primeira versão em produção em março e, a partir daí, ampliar o escopo gradualmente para outros conjuntos de atos e serventias.

O uso de inteligência artificial (IA) na consolidação da situação jurídica foi apontado como um dos avanços mais sensíveis dessa etapa. A equipe relatou que já existem duas frentes de desenvolvimento em curso, uma interna e outra em parceria com centro de pesquisa especializado, treinadas para ler e interpretar matrículas de diferentes perfis de imóveis, superando o foco inicial apenas em unidades autônomas. A meta é reduzir o tempo médio necessário para consolidar matrículas com histórico complexo, hoje frequentemente contado em dias de trabalho humano, por meio de automação assistida. A IA não substitui a decisão do registrador, mas atua como ferramenta que pré-organiza o histórico, sugere a leitura sistematizada dos atos e destaca pontos de atenção, de modo que o profissional possa concentrar sua energia na análise jurídica propriamente dita.

Ao comentar o estágio atual do projeto, o presidente do ONR, Juan Pablo Correa Gossweiler, destacou que a transformação digital do Registro de Imóveis entrou em uma fase em que a prioridade deixa de ser apenas discutir conceitos e passa a ser entregar especificações claras para que as equipes de tecnologia consigam implementar as mudanças nos sistemas dos Cartórios e das instituições parceiras. Segundo ele, a combinação entre a nova modelagem da escrituração eletrônica em JSON, o Cadastro Nacional de Matrículas como identificador único e a consolidação da situação jurídica em formato estruturado “coloca o Registro de Imóveis brasileiro diante de uma oportunidade concreta de falar a mesma língua de dados em todos os estados, sem abrir mão da segurança jurídica que sempre caracterizou o sistema”. Para Gossweiler, a opção de não desenvolver um programa único concorrente aos softwares já utilizados pelas serventias é parte de uma escolha de desenho institucional. Ele observa que “manter a inteligência do processo dentro dos Cartórios, em diálogo com os fornecedores de software, é uma decisão estratégica que preserva a autonomia local, evita distorções no mercado e, ao mesmo tempo, exige que o Operador seja excelente justamente naquilo que é sua função: definir padrões, garantir interoperabilidade e entregar uma infraestrutura confiável para o país inteiro”.

O presidente também relacionou o foco em situação jurídica atualizada, títulos estruturados e automação responsável com a visão de longo prazo para o SREI. Na avaliação dele, “o que está sendo construído é a base para que o Brasil tenha, em poucos anos, uma rede de registro de imóveis eletrônicos capaz de conciliar modelagem de dados sofisticada, uso criterioso de Inteligência Artificial e uma cultura institucional que reconhece que cada Cartório, por menor que seja, é parte de uma única infraestrutura nacional”.

Ao final do encontro, foram apresentadas as próximas entregas da Fase 4, que incluem a conclusão da documentação de modelagem dos atos, a consolidação definitiva do dicionário de dados, a preparação de uma Instrução Técnica Normativa (ITN) a ser submetida à Diretoria Executiva e ao Comitê de Normas Técnicas e a organização de novos workshops com empresas de informática e registradores para apoiar a implementação gradual das inovações. O Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis não é um projeto isolado, mas um processo contínuo, que exige coordenação fina entre tecnologia, regulação e prática registral para que a escrituração eletrônica se converta, na ponta, em serviços mais ágeis, padronizados e seguros para a sociedade.

Por Luana Lopes

Assessoria de Comunicação do ONR